Artigo de João Rodrigues.
Um grupo de 51 pessoas apelou à “reconfiguração da banca”. Comecemos pelos subscritores de um documento que ocupou uma página do caderno principal do Expresso do passado sábado: vai do melhor ao pior, de João Ferreira do Amaral a Eduardo Catroga. Tal mistura não augurava em princípio nada de bom: uma daquelas mistelas do “meio” enviesado para a política de direita, dado o tema e o facto de lá termos responsáveis pelo estado a que isto chegou. Não é tão mau quanto se podia temer: lá se reconhece que a CGD tem de ser pública, que o controlo estrangeiro da banca, que está sendo organizado a partir do exterior, à boleia da União Bancária, é prejudicial à economia do país e que o “triste caso” do Banif não se pode repetir no Novo Banco, sugerindo-se para isso um adiamento da sua venda.
Neste contexto, admite-se um reforço da participação pública, como possibilidade, única forma de evitar novas tristezas, na realidade, mas tal só é admitido a “título transitório”, numa passagem algo obscura (e não são poucas). Sendo este o novo normal na banca, para muitos dos subscritores é o reconhecimento tardio da gravidade da situação criada pela prevalência da banca privada, pela austeridade e pelo aprofundamento da integração, que muitos apoiaram e apoiam.
O principal problema é que se quer traçar algures uma “linha vermelha”, mas sem colocar em causa “os compromissos europeus”, procurando ao longo do texto dar-se a ideia de que o governo pode explorar margens de manobra, mesmo que seja para fazer pouco mais do que diversificar as dependências estrangeiras: talvez Catroga consiga convencer o Estado chinês, já que me parece altamente improvável haver um banco significativo controlado por capitais privados nacionais, uma das ideias aventadas meio a medo, no meio de apelos algo desesperados ao valor da concorrência. No sector bancário, esta ou é perversamente geradora de crises ou é uma ficção, servindo entretanto à poderosa direcção da dita na CE, em articulação com o BCE, para favorecer os Santanderes desta vida. Isto para já não falar dos riscos apontandos de, na nova situação, as poupanças serem canalizadas para o exterior, processo em que a banca privada, a começar pelo antigo BES, há muito se tinha especializado. Neste campo, nada se muda sem reinstituir controlos de capitais, que têm de ir a par das mudanças de propriedade.
De resto, sou céptico em relação à possibilidade de traçar linhas vermelhas no quadro destas regras europeias cada vez mais constrangedoras: em geral e no que à banca diz respeito de forma particularmente intensa, dada a economia política da coisa. Diz que “o regulador nacional não é uma mera delegação do BCE”. Desculpem, mas é: de facto e até acho que de jure no quadro desta monstruosidade bancária que confirma Draghi como o político mais poderoso de Portugal.
Tenham esperança e não corram: quando tudo estiver controlado pelo estrangeiro, pelo Santander e quejandos, a nossa elite chega colectivamente lá…
Publicado no blogue Ladrões de Bicicletas.