Artigo de João Ramos de Almeida.
Dias antes de 28 de Setembro de 2018, data para uma anunciada greve de tripulantes da Ryanair em cinco países, contra a política laboral da companhia, e quando o Governo reunia com a Ryanair para a pressionar a cumprir a lei laboral portuguesa e não aquela que a companhia gostaria de aplicar, a então secretária de Estado do Turismo, do ministro Siza Vieira, achou por bem usar a sua figura de governante numa fotografia promocional da mesma companhia. E o título da foto era: “Olhar para o futuro”( ver foto na página do Facebook da ministra). Um ano depois, Ana Mendes Godinho voltou a Dublin para se reunir com a Ryanair para resolver a questão da “competitividade” do aeroporto de Faro. Cerca de um mês depois, os tripulantes iniciavam uma greve de cinco dias para cumprimento da legislação laboral nacional. Para fragilizar a divulgada posição de força do Governo, não há melhor… Ver aqui e aqui.
Se a promoção da companhia já era abusiva, a coincidência pode revelar muita coisa da actual… ministra do Trabalho. É, pois, enorme a expectativa para ouvir as primeiras intervenções da detentora de uma pasta que devia ser basilar num governo que diz querer o apoio à esquerda, embora ao mesmo tempo também queira a tranquilidade patronal.
Vai a ministra relembrar-se mais das suas antigas funções (página 15) de inspectora do Trabalho e Directora dos Serviços de Apoio à Inspecção do Trabalho entre 2012 e 2015 – período em que o número de inspectores caiu 20% (ver página 17) e o número de visitas se reduziu para metade (ver página 49) – ou da forma como desempenhou as funções na área do Turismo querendo dar toda a força ao sector privado da hotelaria e actividades turísticas onde se aplicam as más práticas da precariedade e baixos salários?
Há uns meses dizia a actual ministra:
“O Turismo é uma arma de transformação, que consegue mobilizar vários players e que tem a capacidade de abrir o mapa de Portugal, alargando-o a todas as regiões e transformando assim o território”. Ou “é essencial não diabolizar o alojamento local“.
Ainda este ano, a actual ministra do Trabalho recebeu o prémio da revista Magazine Imobiliário. “A administradora da empresa, que detém a revista, Palavras Aliadas, referiu que “sem qualquer complexo político ou comercial, para evitar que estejamos a fazer campanha ou atentar dividendos publicitários só podia ser Ana Mendes Godinho”.
Será esta ministra sensível aos efeitos da pressão turística, por exemplo na habitação e, por conseguinte, nos rendimentos disponíveis dos trabalhadores, na sua expulsão para periferias, nos tempos de transportes, na conciliação trabalho/família, enfim, na demografia?
Por que razão António Costa escolheu Ana Mendes Godinho para coordenar a área do Trabalho?
Publicado no blogue Ladrões de Bicicletas, 18/10/2019