Artigo de Mariana Mortágua.
O BES caiu há cinco anos. Quinze dias após Cavaco Silva ter garantido que o banco era de confiança, Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, dava uma certeza repetida por Passos Coelho: “a decisão não terá qualquer custo para o erário público”.
Esta semana, o Novo Banco já veio anunciar mais uma injeção pública de 541 milhões, a somar aos dois mil milhões desde que o atual Governo tomou a desastrosa decisão de vender o banco ao fundo Lone Star.
Cinco anos depois, ainda esperamos que os responsáveis pelo maior escândalo financeiro português (e escândalos não nos têm faltado) sejam levados à Justiça, num processo que se antevê complexo mas que deveria produzir resultados em tempo útil.
Apesar disso, e também graças a um inquérito parlamentar, conhecemos hoje pormenores que nos permitem compreender melhor o banco de todos os regimes. Sabemos como o BES terá mantido um saco azul nas ilhas Virgens Britânicas, a ES Entreprises, para alegados “pagamentos extra” a administradores, gestores e políticos, como Zeinal Bava e José Sócrates. Terá sido também dessa empresa que saíram 253 mil euros para a campanha de Cavaco Silva de 2011. Sabemos como Ricardo Salgado interferiu com empresas estratégicas privatizadas, como a Portugal Telecom ou a EDP. Sabemos da relação entre os interesses económicos portugueses e a cleptocracia angolana, com os primeiros a precisar de negócios lucrativos e os segundos à procura de apagar a origem das suas fortunas. Conhecemos o papel dos offshores nos esquemas ilegais de financiamento do Grupo Espírito Santo, e sabemos como as amnistias fiscais aprovadas por Sócrates, Passos Coelho e Paulo Portas serviram para branquear tantos crimes económicos.
Não se muda o passado, mas é importante olhar para trás e perceber que a raiz do problema não está na honestidade ou estrutura moral das figuras envolvidas. Ao longo de décadas, banqueiros e grandes empresários, políticos e gestores premiados, participaram e beneficiaram da construção das regras de funcionamento da nossa economia. Quiseram estas leis fiscais, influenciaram as privatizações, advogaram pela liberalização financeira e por aquilo a que chamaram o “desenvolvimento” do mercado de capitais. Fizeram passar os seus interesses económicos pelo interesse da economia portuguesa e o resultado está à vista: dívida, tecido produtivo enfraquecido, perda de controlo dos setores estratégicos para capitais estrangeiros.
Cinco anos depois, para além de responsabilidades particulares, devemos exigir outras regras para a economia, em nome do trabalho e do desenvolvimento produtivo do país, e não de uma elite parasitária, nacional ou estrangeira.
Artigo publicado no Jornal de Notícias, 6/9/2019