Artigo de Nuno Teles.
No passado Domingo soubemos de mais um resgate bancário na Zona Euro. O Estado italiano comprometeu-se a pagar até 17 mil milhões de euros na resolução de dois “pequenos” bancos: o Veneto Banca e o Banca Popolare di Vicenza. Depois de anos de resgates milionários nada aqui parecia muito estranho numa UE povoada por bancos zumbis. No entanto, o facto de termos um resgate público do Estado italiano, pouco mais de um ano depois da entrada em vigor da União Bancária na Zona Euro, desfere um aparente golpe na última.
A criação de uma União Bancária Europeia servia dois propósitos explícitos: 1) impedir que sejam os Estados a arcar com os custos de bancos em falência, penalizando em alternativa os credores destes últimos (entre eles, os grandes depositantes); 2) quebrar a excessiva proximidade da banca com os diferentes Estados europeus, fonte de instabilidade monetária na zona Euro (um euro num banco alemão está mais seguro e, portanto, vale mais do que um euro num banco grego).
Em Portugal, a União Bancária teve efeitos ainda antes de entrar em vigor. O BANIF foi vendido rapidamente, a preço de saldo, ao Santander por forma a evitar os custos para os depositantes e o Novo Banco aparentemente foi vendido à pressa ao “fundo abutre” Lone Star devido ao calendário imposto pela UE.
Ora, os dois bancos italianos escaparam ao “mecanismo de resolução europeu”, já que este não considerou que estes colocassem algum risco sistémico à banca italiana e europeia. Em alternativa, a falência destes bancos foi gerida e financiada pelo Estado Italiano, que se apressou a garantir que depositantes e credores seniores, nomeadamente outros bancos italianos, não seriam atingidos. Ou seja, o Estado Italiano interveio por forma a evitar o risco sistémico, cuja hipotética ausência serviu de subterfúgio para a não intervenção europeia. Confuso, não?
Ao abrir excepções tão flagrantes ao seu funcionamento, a União Bancária parece ter falhado estrondosamente nos seus propósitos. Tudo permanece como dantes? Não. A solução encontrada para estes bancos italianos vai de encontro ao projecto do BCE para a banca europeia: integração da banca regional e nacional em grandes conglomerados europeus. Em Portugal e Espanha (com o Banco Popular) foi o Santander, em Itália é o Intesa Sanpaolo, um grande banco italiano, que irá ficar com os activos de qualidade destes bancos e não terá de arcar com os custos dos seus empréstimos a estes dois bancos.
Finalmente, importa notar que, se o objectivo da União Bancária é criar grandes conglomerados europeus, esta política tem com consequência (ou causa?) um tratamento político diferenciado dos países da zona euro, favorecendo as grandes economias, com bancos de tamanho suficiente para terem um alcance europeu, como agora se testemunhou com o tratamento de excepção dado a Itália.
Adenda: Sobre União Bancária fica aqui a minha intervenção num recente seminário sobre “Integração Financeira na Europa” organizado pelo IDEFF da FDUL.
Artigo publicado no blogue Ladrões de Bicicletas.