Artigo de João Rodrigues.
1. O governo “resolveu”, de forma só aparentemente expedita, um problema político legado pelas direitas no Banif. Estas andaram a adiar o problema para iludir os portugueses sobre a natureza da banca: um problema de todos, cuja propriedade teria de reflectir este facto e é preciso repetir isto muitas vezes. Teria, mas não tem: para assegurar a venda rápida neste contexto decidiu-se criar todas as condições ao Santander, o que significa que o controlo da parte “boa” pode continuar a ser privado, mas os custos são sempre socializados, ou seja, tudo o que é mau e duvidoso fica, de forma assumida, por conta do Estado. Fala-se – a Comissão Europeia, que é, com o Banco Central Europeu, quem manda mais, já fala – em cerca de quatro mil milhões de euros de envolvimento estatal global, directo e indirecto, no Banif antes e depois da resolução: entre os mil e cem milhões já injectados, e hoje de resto aprovados em Bruxelas, até aos mais de dois mil milhões para cobrir a tal resolução, passando por uma almofada de centenas de milhões para cobrir riscos do Santander. E isto para um banco relativamente pequeno, com pouco mais de seis mil milhões de euros de depósitos.
2. Tal decisão do governo foi compelida por Bruxelas e por Frankfurt: o Banco que não é de Portugal, mas sim uma sucursal de Frankfurt, “tem em conta” pelo menos os seguintes aspectos: “as consequências de uma provável declaração de ilegalidade do auxílio de Estado ao Banif pela Comissão Europeia (…) a posição das instâncias europeias no sentido de que a alienação do Banif, com auxílio de Estado, é apenas viável num cenário de resolução”. Para tais poderes europeus, o ideal é a promoção de um processo de concentração à escala europeia, com grandes bancos estrangeiros no controlo do que resta na periferia no contexto de uma crise de financeirização indissociável da integração realmente existente. É isto que está de acordo com as suas regras e para isso os recursos públicos da periferia servem. Tudo o resto é ilegal.
3. O Banif deveria ter sido “resolvido”, mas com custos partilhados também pelos grandes depositantes, dado que a garantia pública de depósitos só vai em teoria até aos cem mil euros, e diluído num pólo bancário público revigorado, porque toda a conversa de regulação sem propriedade não passa aqui do equivalente intelectual ao que o sistema financeiro privado fez em grande escala: fraude. Mas este último ponto exigiria desafiar em grande medida as regras europeias (e evitar o primeiro ponto é outra das hipóteses para a pressa). Nada se faz no campo das alternativas sem controlo do Banco Central, sem um Banco de Portugal. A alternativa é rectificar e calar. Atenção, isto não é um país. No campo da moeda e do crédito, do que conta mais no poder económico, isto é uma região. E dependente.
Publicado no blogue Ladrões de Bicicletas.