Artigo de Nuno Serra.
(inicialmente publicado em http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2015/09/o-mercado-de-trabalho-quatro-anos-depois.html)
O especial interesse dos dados do emprego e do desemprego relativos a Junho de 2015 decorre do facto de esta informação estatística permitir avaliar, com precisão temporal, o impacto no mercado de trabalho das políticas de austeridade prosseguidas pela maioria de direita nos últimos quatro anos. Olhando para os grandes números, há três elementos essenciais a reter: entre 2011 e 2015 a população activa diminuiu em cerca de 260 mil pessoas (-4,7%); a destruição de emprego situa-se em cerca de 220 mil postos de trabalho (-4,5%); e o número de desempregados – nos estritos termos dos critérios oficiais – diminuiu em cerca de 38 mil (-5,9%, o único indicador de variação comparativa com significado aparentemente positivo). O que significa que, na legislatura que agora termina, por cada activo que deixou de estar desempregado, sete activos perderam o seu emprego.
Os números do desemprego obrigam contudo, como bem sabemos, a uma análise devidamente cuidada do fenómeno, que tenha em conta realidades que – não sendo consideradas pelos valores oficiais – configuram situações de desemprego (tanto em 2011 como em 2015). Isto é, trata-se fundamentalmente de saber como evoluiu o desemprego que não é reconhecido pelas estatísticas e que peso assume hoje numa aproximação mais realista ao problema. Neste sentido, verificou-se um aumento, entre 2011 e 2015: do número de desempregados ocupados em cerca de 130 mil (+500%); do número de activos desencorajados em cerca de 90 mil (+51%); e do volume de subemprego em cerca de 36 mil (+17%). Ao que se soma o êxodo de activos, decorrente do aumento exponencial do saldo migratório negativo acumulado, que se elevou até um valor de 384 mil, em 2015 (+1300%). Ou seja, considerando este conjunto de realidades, passamos a registar um aumento de desempregados na ordem das 537 mil pessoas entre 2011 e 2015 (e não o decréscimo de 38 mil registado, no mesmo período, pelas estatísticas oficiais).
Uma das implicações desta linha de análise aponta, necessariamente, para que não sejam consideradas, como emprego, algumas das situações anteriormente referidas. Isto é, se apurarmos a variação do emprego, entre 2011 e 2015, sem contabilizar os desempregados ocupados e as situações de subemprego, constatamos que a destruição do mercado de trabalho traduz a perda de 385 mil empregos e não, como indicam os números oficiais, de 219 mil. Isto é, a contracção do emprego nos últimos quatro anos foi de 8,4% e não, como as estatísticas sugerem, de 4,5%.
Quer isto dizer que o desemprego não diminuiu e que não foi criado emprego, a partir de 2013? Não. Como assinalou recentemente Pedro Lains, «a economia portuguesa está naturalmente a recuperar, depois de uma forte contracção de perto de 10%, desde o início da crise financeira». A questão essencial é que essa recuperação resulta «da ténue recuperação europeia e (…) do facto de o Governo não ter implementado medidas de austeridade adicionais, desde há um ano ou algo mais», graças ao Tribunal Constitucional e às inversões ilusórias necessárias, para «que [não] se lixem as eleições».
Ou seja, a ténue recuperação da economia e do emprego não traduz – ao contrário do que o governo acredita (ou pretende que acreditemos) – de uma suposta transformação estrutural da economia portuguesa, decorrente das políticas de empobrecimento e de subdesenvolvimento seguidas nos últimos anos. Aliás, basta deixar passar as próximas semanas, e aguardar que a nuvem cor-de-rosa artificial se dissipe, para vermos – caso a maioria ganhe as próximas eleições – o regresso rápido e em força às políticas de austeridade, essa ferramenta política indispensável para que a direita concretize, até onde puder, a sua agenda ideológica.