Artigo de Helena Silveirinha.
O mundo é redondo, o que quer dizer que por mais voltas que se dê, a probabilidade de acabar no mesmo sítio é grande. Isto para chegar à conclusão que voltamos sempre ao mesmo, à força do dinheiro que como diz a canção do Caetano Veloso, ergue e destrói coisas belas.
Vi umas imagens em que o Donald Trump dizia, não sei se em resposta a uma jornalista ou como recado para a América, que com ele a indústria militar iria beneficiar muito. Mas ele é um palhaço, respondem-me. Certo. Mas é dos palhaços que eu mais medo tenho. É que aos palhaços tudo lhes é permitido. Afinal, eles atuam num mundo ilusório, do faz de conta. O problema é quando os palhaços passam para o mundo real e aí deixam de ter piada.
O drama dos refugiados, que só agora, quase a entrar numa fase incontrolável (para nós, europeus), começa a despertar a necessária atenção, mais pelos incómodos que está a causar do que pela dimensão humanitária, tem também uma mão invisível. Não tanto a conceptualizada por Adam Smith, de autorregulação, mas aquela que faz com que à custa de lágrimas e sangue a economia se desenvolva e o crescimento económico seja uma realidade para alguns, apesar de haver um risco cada vez maior de no final pagarmos todos.
Que preço paga a humanidade para ter petróleo mais barato, necessariamente comprado também ao auto intitulado estado islâmico e com o qual as armas são compradas e a guerra financiada? Quanto custa realmente um barril de crude, já incluídas as mortes e miséria a ele associada? Alguém o está a comprar e se calhar também nós o estamos a consumir.
Com a internet a informação está toda lá, é só querer ver. O Stockholm International Peace Research Institute, instituto independente dedicado à investigação na área dos conflitos e armamento, mostra-nos quais foram em 2014 os maiores exportadores de armas. Metade da lista com o top 10 é preenchida por países da União Europeia, sendo que logo a seguir aos Estados Unidos e Rússia, que ocupam os dois primeiros lugares, surge a França, o Reino Unido, a Alemanha e a Espanha.
Existe uma pergunta clássica nos inquéritos de ciência política, para aferição do posicionamento ideológico dos indivíduos, onde se questiona se o crescimento económico deve ter sempre prioridade, mesmo que seja à custa da proteção ambiental. Talvez seja chegada a hora de reformular a questão e passar-se a perguntar se o crescimento económico deve ter sempre prioridade, mesmo que seja à custa de vidas humanas. Com a questão ambiental também lá chegaremos, mas através das guerras o efeito é mais rápido.
É claro que esta situação não é de hoje e em muitos pontos do globo a indústria da guerra mata aos milhares, já há muitos anos. Chegou porventura a nossa vez de lidarmos com o problema, pelo menos por via indireta, através dos que nos batem à porta, mais do que pedindo, implorando por ajuda.
E agora? Que resposta vamos dar? Que preço estamos dispostos a pagar pelo crescimento económico, que no final nem sequer tem de ser feito assim?
Acordai, diz a canção de Fernando Lopes-Graça. É bom que acordemos mesmo, a todos os níveis. Se não o fizemos resta-nos aquela única certeza, quase como que uma justiça divina: no final acabamos todos por morrer, os que sofrem pela ação dos outros, mas também os que fizeram sofrer e com isso muito lucraram.