Artigo de João Ramos de Almeida.
Pedro Passos Coelho tem uma malapata com a questão da TSU e já o devia saber.
Mas essa malapata advém da irresponsável leviandade e crassa impreparação com que a direita insiste, nos últimos quatro anos, em aprovar essa medida assassina para a Segurança Social.
O objectivo oficial da medida é dar maior competitividade externa à economia portuguesa, reduzindo os custos das empresas para que se reflitam numa descida dos seus preços finais. (ver minuto 10).
1) Olhando para as estatísticas nacionais, toda esta confusão estaria a ser feita por 4% dos custos de produção das empresas nacionais (números de 2012, os mais recentes). Ou seja, para que a medida tivesse efeito sensível, seria necessário acabar com quase todos os descontos das empresas para a Segurança Social, ficando apenas os trabalhadores a cuidar da sua protecção social. É este o objectivo não declarado? Por outro lado, os custos com serviços contratados pelas empresas representam 35% dos custos de produção! Mas aí nada de concreto se faz… Faz isto sentido à luz do objectivo declarado?
2) Olhando para os descontos sociais que as empresas poupariam, a medida facilitaria a vida aos grandes empregadores nacionais como as grandes cadeias de distribuição – Pingo Doce e Sonae, os CTT (foram privatizados, não foram?), multinacionais de trabalho temporário, etc. Uma empresa com um trabalhador pouparia 680 euros ao ano. Uma com 350 trabalhadores 350 mil euros (números de 2010). Com mil empregados, é só fazer as contas… Faz isto sentido quando a maioria das empresas são pequenas e médias? Ou quando os grandes empregadores não estão em concorrência internacional?
3) Se a ideia é compensar a Segurança Social com o acréscimo de descontos vindos do crescimento do emprego – como atabalhoadamente sugeriu agora Marco António Costa, o ex-secretário de Estado da Segurança Social e coordenador Permanente da Comissão Política Nacional e Porta-Voz do PSD – então por cada ponto percentual de descida da TSU, teriam de ser criados 165 mil postos de trabalho a ganhar o SMN. Ou seja, tudo indica que nem contas foram feitas: apenas se quis enganar os jornalistas e, consequentemente, o povo;
4) E depois como é possível garantir que a descida da TSU se traduza numa descida de preços internacionais? Algo improvável ou impossível, sobretudo quando todos os ganhos de margem deverão ser usados para pagar dívidas entretanto contraídas com os pacotes de medidas recessivas que este Governo aprovou em nome dos credores internacionais. Trata-se de um ponto importante, já que, como veio a referir em Julho de 2011 a equipa inter-ministerial, se isso não se verificar, isso “limitaria o impacto desta medida na competitividade externa da economia portuguesa” e “o custo para a sociedade seria elevado, uma vez que se está a transferir poder de compra dos consumidores para lucro dos produtores” de exportações e “constituiria um subsídio às empresas menos eficientes”. Ou seja, transferência de rendimento;
5) Mas o que é certo é que por cada ponto percentual de descida da TSU, a Segurança Social perde 400 milhões de euros de contribuições. Faz isso sentido quando, como disse Pedro Passos Coelho na passada sexta-feira no Parlamento, “nós temos um problema estrutural de sustentabilidade das pensões”? Parecem doidos…
Mas que estudos de impacto foram feitos para se defender tamanha aventura? Que se conheça, apenas os realizados por aquela comissão técnica inter-ministerial e que, aliás, se mostrou bastante crítica. Todo o historial da medida em Portugal (contado num dos Cadernos do Observatório sobre Crises e Alternativas, ver a partir da página 10), é um catálogo de trafulhices, confusões, pés pelas mãos, mentiras descaradas, impreparações criminosas, cumplicidades políticas e ideológicas face a algo que mexe com a vida de milhões de portugueses.
A difamação é punida como crime. Mas quem aprova ou quer aprovar medidas sem estudos de impacto, que prejudicam milhões de pessoas, sai impune ou com um eventual castigo político em eleições.
Lembram-se que, quando Passos Coelho recuou em 2012, disse que a medida tinha sido mal percepcionada e que assim não valia a pena? Mas então por que se insiste mais uma vez? E de forma tão tosca? E aparentemente sem estar em concertação nem com o seu parceiro de coligação nem com a ministra das Finanças que, na primeira oportunidade, matou a ideia na apresentação do Programa de Estabilidade e Plano Nacional de Pensões? E em vésperas das eleições? E com o porta-voz do PSD – do PSD? – a sair a terreiro em defesa de Passos Coelho?! Será que há alguma relação entre esta medida e as eleições? Será que a medida vai ao encontro de possíveis financiadores de campanha eleitoral?
Artigo publicado no blogue Ladrões de Bicicletas.